Abuso sexual - O que eu fiz com o que fizeram comigo?

No início eu só tentei esquecer e fingir que nada tinha acontecido. E hoje, com mais maturidade, posso olhar para trás e entender que esse sentimento era só o início do processo que eu estava começando a enfrentar. Uma vez eu li uma frase e achei um absurdo, mas hoje consigo enxergar minha realidade nela. A frase dizia: "a dor precisa ser sentida" - isso é muito real, não importa o trauma que você esteja enfrentando, a dor que você sente faz parte do processo de cura que você precisa. Tentar colocar uma pedra em cima daquilo que passamos ou sentimos parece corajoso e maduro, mas não é. Nada é mais corajoso do que lidar de frente com o trauma. Eu precisei de um longo tempo para vencer a intimidação, o medo e a vergonha.

Eu não consigo imaginar o que seria de mim se Jesus não tivesse ido ao meu encontro. Penso comigo que talvez não teria força e coragem suficiente para enfrentar, por isso que sou tão grata, pois até em minha profunda fraqueza eu sou forte, pois estou com Ele.

O primeiro passo que tomei foi em conversar com alguém da minha confiança e posso me lembrar do quanto isso me deixou mais leve. O abuso faz um estrago tão grande que nós vítimas carregamos um profundo sentimento de culpa, ao ponto de sentir vergonha do que aconteceu. É estranho porque a vergonha recai sobre nós e não sobre o verdadeiro culpado. Quem deveria se sentir sujo era o abusador, mas são as vítimas que se sentem. São as Marias que por mais que tomem banho não conseguem limpar a alma, são as Joanas, as Carlas, as Fernandas, as Elaines, e tantas outras mulheres que acabam perdendo o valor como pessoa. Nos sentimos desvalorizadas e culpadas, enquanto o outro sai por aí com um pedaço nosso dentro dele. Entender isso me deu coragem de encarar essa dor de frente e não deixar ela ter poder sobre mim. Jesus resgatou o olhar sobre meu próprio valor. Foi como enfrentar um tempo de luto, a diferença é que era eu quem estava morta. Vivi um tempo do meu próprio luto, mas eu fiz com que esse tempo chegasse ao fim, decidi renascer e ao invés do abuso acabar comigo, eu acabei com ele.

Existem dois caminhos e ambos são dolorosos, mas um deles faz com que a dor acabe e você consiga seguir em frente, enquanto o outro te deixa paralisada pensando no quanto sua vida poderia ser diferente. Quando consegui abrir meu coração para pessoas confiáveis pude ver que não estava mais sozinha e isso me trouxe coragem pra aceitar que eu estava ferida e precisava de ajuda. Por um momento fiquei cega pela dor, pela raiva e pela mágoa; até perceber que aquele homem já havia arrancado muito de mim e eu não podia deixar ele levar consigo o resto da minha vida. A dor te impede de ver que você precisa tomar uma decisão, ela vai te dominando e tomando conta de você até que você não enxergue uma saída e ache que não tem mais jeito. O abuso confundiu a minha identidade que por muito tempo eu me culpei e procurei erros em mim. Ele errancou o pouco do valor que eu ainda sentia por mim mesma. Eu estava completamente destruída, até que eu decidi sair do papel de vítima e quando eu falo isso, eu falo sobre tirar o rótulo que eu havia colocado em mim. Decidi não me rotular mais assim, mas cada um enfrenta seu trauma de uma maneira. Nas áreas em que eu me sinto forte, talvez você ainda tenha dificuldades e está tudo bem. Eu demorei anos para contar para as pessoas que eu amo. Eu tive mais dificuldade em me perdoar do que perdoar o meu abusador. Se você sente que também precisa, então se perdoe. Você não vai superar isso sem se perdoar!

O perdão é a chave para fechar essa porta uma vez por todas. Perdoar não significa não denunciar e não querer justiça; se você se sentir pronta chame alguém de sua confiança, não espere, vá e faça uma denúncia.

Perdoar é decidir viver sem ressentimentos, pois eles adoecem nossa alma e nos levam a uma vida marcada por problemas emocionais. Mas não se torture, tudo isso leva um tempo. Eu passei pelo meu e ninguém tem que te dizer que você está pronta pra isso ou aquilo. Você saberá!

Para mim nunca foi se ele mereceu ou não, era sobre mim e não sobre ele. Quando eu decidi que ele não levaria mais nada meu, isso incluia a minha paz também. Quando nos perdemos na mágoa a pessoa que nos machucou continua vivendo, nós é que ficamos presos a ela. Eu não queria que restasse nada dele em mim, por resgatar o meu valor eu perdoei e me vi livre de verdade!

Sim, hoje eu me sinto livre para falar disso, mas eu e você somos pessoas diferentes. É a sua história, a sua ferida e só você que pode decidir o que fazer com ela. Cada pessoa tem um tempo e isso pode levar meses ou anos. Talvez você nem sabe que tem um trauma dentro de você. Em alguns casos esses flashes são tão dolorosos que ficam completamente escondidos em nosso subconsciente e só depois de muitos anos que começamos a percebê-los. Conheço alguns casos de pessoas que lembraram dos abusos depois de quase 30 anos. Então não se culpe e nem se envergonhe se ouvir a frase: "por que não denunciou antes? Por que está falando só agora?" A dor é sua, você vai saber quando for o tempo de falar e para quem falar.

Meu interior não é mais um caos. Jesus pegou todos os cacos da minha vida e restaurou. O abuso não me faz inferior e eu tenho aprendido que virar a página é não ter vergonha das marcas que eu carrego, pois elas tornaram quem eu sou hoje!

Elaine Santos - 26 Anos

Casada, com o coração curado e mãe de dois meninos lindos. Benício e Bernardo! ❤️🌻